Bento XVI recebe (2011) Javier Echevarria, prelado-mor da Opus Dei. Grupos fundamentalistas rivais
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O cardeal alemão
Joseph Ratzinger chegou a ser chamado de “rotweiller do papa”, nos anos 1980 e
1990. Era, então, o todo poderoso prefeito da Congregação para a Doutrina da
Fé, a antiga Santa Inquisição. Eminência parda de João Paulo II – a quem
sucedeu, em abril de 2005 -, Ratzinger defendeu ferozmente a restauração do
poder episcopal, a volta à ortodoxia.
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Combateu a
Teologia da Libertação e ajudou a dizimar a Igreja identificada com a opção
preferencial pelos pobres, a partir do Concílio Vaticano II (1962-1965),
principalmente na América Latina. Ratzinger foi o algoz do brasileiro Leonardo
Boff, seu ex-aluno. Calou o teólogo franciscano com o “silêncio obsequioso”, em
1985.
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No comando da
Santa Sé, já como o papa Bento XVI, cercou-se de cardeais conservadores,
fortalecendo uma linha de ação delineada no pontificado de João Paulo II. Deu
poder a movimentos católicos de inspiração autoritária e ultraconservadora.
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Incrustados na
Cúria Romana, esses grupos iniciaram uma acirrada disputa pelo poder. Vários
auxiliares foram acusados de desvios financeiros e envolvidos em outros
escândalos, como os casos de pedofilia.
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Sem controle da
situação, Bento XVI –agora às vésperas de sua renúncia –, descobriu tardiamente
que não governava sozinho. Em meio a uma rede de intrigas, vaidades e ambição,
perdeu o comando. Se viu sem forças.
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Nomeações feitas
por ele sem seguir preceitos e hábitos comuns no Vaticano também geraram fortes
reações. Ao recrutar antigos colaboradores, colocando-os em postos-chave,
contrariou interesses de esquemas enraizados na Santa Sé.
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Até os anos 1990,
só se falava na divisão interna na Igreja entre os chamados conservadores e
progressistas. Hoje, são os integrantes dos grupos mais à direita, incensados
por Bento XVI, que o sabotam.
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O papa, após
anunciar sua renúncia, criticou “a divisão no corpo eclesial” que deturpa “o
rosto da Igreja”. Denunciou a “hipocrisia religiosa” e o comportamento daqueles
que querem “aparecer”, que buscam o “aplauso e aprovação”. Bento XVI só não
identificou quem seriam esses “hipócritas” que lutam desbragadamente em busca
do poder na Santa Sé.
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À frente, nessas
disputas, estão fortes correntes conservadoras na Igreja Católica, como a Opus
Dei, considerada um verdadeiro “exército do papa”. O outro grupo mais
expressivo é a Fraternidade de Comunhão e Libertação, cujos membros, por causa
da fervorosa devoção, chegaram a ser rotulados de “stalinistas de Deus” e
“rambos do papa”. No pontificado de João Paulo II eram os “monges de Wojtyla”.
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A Opus Dei e a
Comunhão e Libertação são os dois grupos com mais força atualmente na Igreja
Católica. Mas despontam ainda outros movimentos como os Focolares, o
Neocatecumenal e os Legionários de Cristo.
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A Opus Dei,
fundada em 1928 na Espanha pelo sacerdote Josemaria Escrivá (canonizado em
2002), cresceu no país durante a ditadura de Francisco Franco, de 1936 a 1975.
Hoje, está em 90 países, com 89 mil seguidores em todo o mundo.
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Seu objetivo,
segundo os líderes, é difundir a vida cristã. Certas práticas atribuídas aos
seguidores são criticadas, como um suposto hábito de golpear costas e nádegas
com chicote. Adeptos seriam obrigados ainda a relatar aos superiores até seus
pensamentos.
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Grande parte dos
integrantes da Opus Dei ocupa cargos de liderança e destaque na sociedade. A
organização conta em seus quadros com cardeais, bispos e, ao menos, dois mil
sacerdotes. Mantém instituições de ensino como a Universidade de Navarra
(Espanha), um seminário em Roma, 600 colégios e 17 escolas de administração e
negócios.
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Seu braço para a
área empresarial é o IESE Business School (Instituto de Estudos Superiores de
Empresa), instalado também no Brasil e com planos de oferecer cursos no País –
entre eles um de gestão de mídia – a 500 alunos. No Brasil, são ligados à Opus
Dei o jurista Ives Gandra Martins e o professor de Comunicação Carlos Alberto
Di Franco, entre , entre outros.
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O governador de
São Paulo, Geraldo Alckmin, revelou em uma entrevista que seu livro de
cabeceira é “Caminho”, de Josemaria Escrivá. Disse ser admirador das ideias do
sacerdote espanhol, mas nega ser seguidor da Opus Dei.
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Presente em 80
países e com cerca de 200 mil simpatizantes, o movimento Fraternidade de
Comunhão e Libertação tem como seu maior expoente o cardeal de Milão, Angelo
Scola, ligado a Bento XVI. Foi fundado em 1954 na Itália pelo monsenhor Luigi
Giussani e hoje é dirigido pelo espanhol Julián Carrón. Seus integrantes
propõem a cultura como “chave de leitura da história”. Os conflitos na
sociedade, na visão deles, devem ser analisados a partir da cultura e não da
luta de classes ou de questões econômicas.
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Fundado em 1943,
na Itália, por Chiara Lubich, o movimento Focolares reúne hoje 100 mil membros.
Tem como um de seus principais representantes em Roma o cardeal brasileiro João
Braz de Avis, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e
Sociedades de Vida Apostólica. É um nome bastante citado como papável.
Ex-arcebispo de Brasília, Avis ainda integra o Pontifício Comitê para os
Congressos Eucarísticos.
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O movimento
Focolares é considerado uma “associação de fiéis de caráter privado e universal
de direito pontifício” e seus integrantes se dizem “consagrados na pobreza,
castidade e obediência”.
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Presente em 15
mil comunidades de 105 países e com um milhão de seguidores hoje, o movimento
Neocatecumenal surgiu em Madri, nos anos 1960. Foi criado pelo pintor espanhol
Francisco Argüello. Seu objetivo era ajudar paroquianos a buscar a
evangelização numa época de sociedade “descristianizada”.
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Outra corrente
religiosa, a Congregação dos Legionários de Cristo, foi criada em 1941, na
Cidade do México. Seu fundador, o padre mexicano Marcial Maciel, foi acusado de
abusar sexualmente de seminaristas menores de idade. Após denúncias e visitas
de uma comissão nomeada pelo papa Bento XVI, a organização sofreu uma
intervenção da Santa Sé.
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Em meio a esse
emaranhado de grupos, visões e interesses distintos, os conflitos na Cúria
Romana se avolumaram. Na busca pelo poder, cargos são disputados ferrenhamente.
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Ao nomear
representante de um grupo para um posto importante, o papa desagrada outros.
Tensões ocorreram, por exemplo, a partir de indicações como a do italiano
Ettore Gotti Tedeschi, ligado à Opus Dei, para o Instituto de Obras Religiosas
(IOR), o banco do Vaticano. Tedeschi assumiu em 2009 e foi demitido no ano
passado, por má gestão.
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Amigo do papa,
Tedeschi teria sido vítima de um complô armado por conselheiros da instituição
financeira para desmoralizá-lo. Por trás, estaria o cardeal Tarcísio Bertone, secretário
de Estado do Vaticano, segundo documentos vazados no chamado escândalo
VatiLeaks. O banco, conforme denúncias, recebia dinheiro de origem duvidosa.
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A nomeação do
próprio Bertone para a Secretaria de Estado teria gerado insatisfações. O
motivo seria o fato de Bertone não vir da área diplomática, o que seria uma
tradição na Cúria Romana nas indicações para tal cargo. Ex-secretário de
Ratzinger na Congregação para a Doutrina da Fé, Bertone é salesiano.
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Bento VXI também
removeu do cargo de porta-voz do Vaticano o espanhol Joaquim Navarro Valls, um
quadro da Opus Dei bastante próximo de João Paulo II. Valls ocupava a função
havia 22 anos e foi substituído pelo padre jesuíta Federico Lombardi.
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Outra atitude
considerada incomum foi a remoção, em 2011, do cardeal Angelo Scola, então
primaz de Veneza e detentor de vários cargos na Cúria Romana, para o posto de
arcebispo de Milão.
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Scola, do
movimento Comunhão e Libertação, é apontado como um dos favoritos para a
sucessão de Bento XVI. Sua ida para Milão pode ter sido um indicador, segundo
vaticanistas, de que seja o nome preferido pelo papa para sucedê-lo. O papa
também transferiu um bispo brasileiro, Filipo Santoro, de Petrópolis para uma
diocese da Itália, a fim de que ele pudesse servir mais de perto ao movimento
Comunhão e Libertação.
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Ex-assessor da
CNBB e estudioso dos assuntos do Vaticano, o padre Manoel Godoy,
diretor-executivo do Instituto Santo Tomás de Aquino (de Belo Horizonte),
alerta que o próximo papa deverá fazer mudanças profundas na Cúria Romana para
não virar refém das atuais estruturas de poder. Segundo Godoy, cardeais
eméritos que continuam na Santa Sé acabam formando grupos de conspiradores
capazes de desestabilizar o papado. “Os cardeais aposentados ficam lá. Têm
muito tempo para arquitetar planos e propostas e não deixam o papa governar”,
constata.
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Alguns desses
cardeais, como os italianos Angelo Sodano, decano do Colégio Cardinalício, e
Giovanni Batista Ré, o eslovaco Josef Tomko e o colombiano Dario Castrillón
Hoios, seriam simpáticos a interesses defendidos pela Opus Dei.
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digg
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