A Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) foi
criada pelo Ministério da Educação (MEC) em 2013 para identificar os índices de
alfabetização e letramento em língua portuguesa e matemática de crianças entre
8 e 9 anos. Segundo o documento básico, disponível no site do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o objetivo é
“concorrer para a melhoria da qualidade de ensino e redução das desigualdades,
em consonância com as metas e políticas estabelecidas pelas diretrizes da
educação nacional”.
Testes nacionais para avaliar a alfabetização podem fazer com que pré-escolas comecem o letramento cedo demais para aumentar suas notas (foto: New Castle School)
Porém, esta avaliação está
reforçando uma visão que já existe em muitas escolas de educação infantil. Em
entrevista para a Revista
Educação, a professora Sandra Zákia Sousa, da Faculdade de Educação
da Universidade de São Paulo (USP), argumentou que a ANA faz com que os
professores de Educação Infantil antecipem os processos de alfabetização e
letramento, pulando etapas importantes no desenvolvimento da criança, como
coordenação motora e capacidade de raciocínio e concentração. Na mesma
reportagem, Luiz Carlos de Freitas, da Faculdade de Educação da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), defende que essa avaliação deveria acontecer
somente a partir do final do Ensino Fundamental.
O
letramento precoce tem sido tema de diversos debates e motivou a decisão do
Superior Tribunal de Justiça (STF) em fevereiro deste ano, que
decidiu que crianças menores de 6 anos não podem ser matriculadas no Ensino
Fundamental, ainda que tenham capacidade intelectual comprovada por
avaliação psicopedagógica. A posição em relação ao tema tem influenciado os
diversos formatos de escolas de Educação Infantil: enquanto há escolas infantis
que antecipam lições ligadas à leitura, à escrita e à matemática na fase do
antigo “pré-primário”, há instituições cuja linha pedagógica defende que a
criança precisa priorizar o desenvolvimento de outras habilidades antes de se
alfabetizar.
Esse argumento tem embasamento
teórico em filósofos como o austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), um dos
introdutores da pedagogia Waldorf, que defende que
crianças com até 7 anos de idade devem se preocupar somente em brincar. Ao participar de jogos e
atividades lúdicas, os pequenos desenvolvem a confiança em seu corpo e em suas
potencialidades, o que é essencial para encarar a maior parte das atividades da
vida, além das habilidades físicas e motoras, que são fundamentais para o
desenvolvimento neurológico e sensorial. Se essa fase for vivida de maneira
adequada, meninos e meninas terão maior domínio corporal, linguagem oral e,
principalmente, capacidade para se adaptar às situações.
Na mesma linha, o psicólogo bielorrusso Lev Vygotsky defendia
que a alfabetização fosse um processo gradual estimulado desde a primeira
infância, mas sem que atividades mecânicas de leitura e escrita atrapalhassem
ou forçassem as etapas de desenvolvimento.
Ao estimular precocemente a leitura e a escrita, a criança pode
sofrer problemas como deficiências na coordenação motora, apatia, desinteresse,
desmotivação e estresse. Por isso, a educação infantil deve se preocupar em
proporcionar atividades condizentes com a fase de desenvolvimento da criança e
respeitar as necessidades dessa etapa da vida, que é, sobretudo, brincar.
Forçar o avanço na alfabetização antes do tempo pode criar traumas e
dificuldades maiores no futuro.
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Fonte: PlayTable
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