O rito do impeachment da presidenta
Dilma, deflagrado na semana passada, tinha seu segundo capítulo marcado para
esta segunda-feira, quando a Câmara dos Deputados deveria instalar a Comissão
Especial que analisará o processo, composta por 65 deputados. Mas, a falta de
consenso sobre os integrantes desse colegiado fez com que o presidente da
Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), adiasse a formação da
Comissão para esta terça. Inicialmente os partidos tinham até as 18h de hoje
para indicar seus representantes. Cada partido tinha um número definido, a
partir do tamanho da bancada na Casa: PT e PMDB tinham direito a indicar a
maioria. No entanto, divergências internas no PMDB fizeram com que a ala
rebelde da legenda, favorável ao impedimento, se articulasse com parlamentares
da oposição para lançar uma nova chapa, com viés mais anti Governo, para
garantir que o impeachment avance no Congresso.
Os dissidentes peemedebistas reprovaram
as escolhas feitas inicialmente pelo líder do partido na Casa, Leonardo
Picciani (RJ), para compor a cota da legenda
no colegiado. O deputado, que defende abertamente o Governo, deu preferência a
nomes moderados ou favoráveis a Dilma, o que foi rejeitado pelo resto da
bancada e a oposição. Agora, os partidos precisam indicar novos nomes até as
14h desta terça. Para garantir uma maioria anti-Dilma na nova chapa, a oposição
precisa arregimentar, no mínimo, 33 integrantes. Alcançado este número, o
plenário vota. Se a chapa vencedora estiver completa - com 65 membros -,
existem duas alternativas: ou o presidente da Casa, Eduardo Cunha, indica os
representantes dos partidos que não apresentaram deputados (algo que ele
afirmou que não fará), ou são feitas novas eleições suplementares para
preencher as vagas remanescentes. A expectativa é de que esse processo atrase
ainda mais o início dos trabalhos da comissão.
O adiamento é uma derrota para o
Planalto, que ocorre contra o relógio para finalizar o processo de
impeachment o quanto antes. Isso porque, na leitura do Governo e de
especialistas, Cunha e a oposição ainda não têm os 342 votos necessários para
aprovar o afastamento de Dilma no plenário da Câmara depois que a Comissão apresentar
seu relatório. Além disso, a avaliação dos petistas é de que caso o processo
não seja engavetado logo,a crise econômica e política pode se aprofundar.
“A oposição e os aliados de Cunha precisam de tempo para conseguir esse número,
por isso o Governo quer acelerar o processo”, diz o cientista político Paulo
Kramer. Para ele, quanto mais rápido o processo chegar ao plenário, melhor para
Dilma e pior para Cunha, que está em julgamento na Comissão de Ética pelas
denúncias em que foi envolvido na Lava Jato.
O adiamento é uma derrota para o Planalto, que corre
contra o relógiopara finalizar o processo de impeachment o quanto antes
Além dos problemas cronológicos
enfrentados pelo PT, David Fleischer, cientista político da Universidade de
Brasília, não descarta que a bancada do PMDB destitua Picciani da liderança e
indique para o cargo um deputado mais alinhado com o presidente da Casa. “A
maioria do partido é contra a Dilma, logo o Cunha e seus correligionários
querem tirá-lo do comando da legenda”, diz. Neste caso, o professor acredita
que haverá um atraso ainda maior em todo o processo. A reportagem não conseguiu
entrar em contato com Picciani, que deixou a Câmara para se reunir com o
ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini.
Cunha afirmou que o adiamento teve
como objetivo evitar uma possível judicialização do caso. "Temos que ter
muito cuidado para evitar que esse processo seja inviabilizado por qualquer
erro", afirmou, após dizer que não pode "cercear o direito de quem
queira se inscrever [para disputar a comissão]". Segundo ele, a medida
está prevista no regimento interno da Casa e na Constituição.
"Chapa branca"
O líder do DEM na Câmara, Mendonça
Filho (PE), afirmou que o objetivo na nova chapa é “desmontar essa equação
construída pelo próprio Governo de controlar a comissão especial, [e
transformá-la] em uma verdadeira Operação chapa branca”. Sem citar o
PMDB, o deputado disse que a dissidência que motivou a criação de outra chapa
nasceu da base governista. “Se eles estão insatisfeitos e manifestam sua
insatisfação com relação à operação abafa dos seus líderes, eles são muito bem
vindos”. Ele voltou a dizer que a oposição precisa de apoio dos parlamentares
rebeldes da base para conseguir emplacar o impeachment: "A gente precisa
da colaboração de dissidentes".
Mendonça também deu a entender que o
objetivo da chapa paralela é empurrar a votação do relatório final para depois
de janeiro, o que iria de encontro aos interesses do Planalto. Ele afirmou que
o Governo tenta “votar o impeachment quando a opinião pública está
desmobilizada, durante o mês de janeiro”. Aliados de Dilma tentam cancelar o
recesso parlamentar para agilizar uma definição, uma vez que segundo especialistas,
a oposição ainda não conta com os 342 votos necessários para aprovar a saída da
presidenta.
Um dos pivôs da crise, Picciani
criticou a manobra, mas negou que a celeuma tenha sido provocada pelo PMDB. Ele
afirmou também que uma lista paralela pode inviabilizar a instalação da
comissão. “Nós começamos de forma ruim. O acordo era a definição de uma chapa
única, mas parte da oposição voltou atrás”. Segundo ele, a disputa pela
composição do colegiado provocará indefinição: “Pode ser que uma chapa seja
eleita e, depois, indefinidamente, recuse as indicações da outra chapa”. O
líder do Governo na Casa, José Guimarães, criticou o adiamento: “Eles querem
compor maioria sem ter maioria. Não aceitamos esse tipo de manobra”.
Cunha, que foi acusado por petistas
de se beneficiar com o adiamento, uma vez que a medida poderia inviabilizar a
realização da reunião da Comissão de Ética que irá julgar a cassação de seu
mandato, disse que o atraso não vai interferir nos trabalhos do colegiado.
Temer dividido
O ex-ministro da Aviação Civil Eliseu
Padilha, que apresentou sua demissão na semana passada e oficializou
sua saída do Governo nesta segunda, admitiu que o PMDB está
"dividido" sobre o impeachment de Dilma. Segundo ele, o
vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP) estaria sondando os
parlamentares da legenda para tomar uma posição sobre o tema. "Se ele não
tomou até agora nenhuma decisão, não fez manifestação nesse sentido, é porque
está aferindo o que o partido dele, que tem toda essa segmentação, está
pensando e querendo".
Padilha é próximo de Temer, e sua saída provocou
rumores de que o vice também estaria disposto a desembarcar do Governo,
deixando Dilma entregue à própria sorte sem se movimentar para acalmar os
setores dissidentes de seu partido. Se publicamente a presidenta diz confiar
integralmente no peemedebista, nos bastidores integrantes do núcleo duro
petista afirmam que seu vice não está agindo para conter a ofensiva contra o
Governo. Temer seria um dos maiores beneficiários do impeachment, já que
herdaria a cadeira de Dilma.

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